Como a construção coletiva pode alavancar negócios
Lições da ISO 26.000 e da IN2 na gestão de projetos ambientais
Durante processos de licenciamento ambiental, seja nas fases prévia, de instalação ou de operação de empreendimentos que provocam alterações significativas no território, um dos maiores desafios para o empreendedor é conseguir estabelecer, de forma adequada e eficiente, o diálogo com as comunidades locais e outros públicos-alvo que interferem direta ou indiretamente com a viabilização das metas planejadas para o investimento realizado. Construção compartilhada de conhecimento, tomada de decisões de modo participativo, responsabilidade social e transparência, muito mais que conceitos, são práticas que podem (e devem) ser revertidas em oportunidades para o empreendedor, com a geração de ganhos para todos os envolvidos.
É inegável que ainda persistem modelos organizacionais que prezam pela centralização e hierarquia da informação e, portanto, para os quais dialogar com os diferentes públicos intervenientes representa uma ameaça a esse status quo. Assim, mesmo com a regulamentação de projetos de educação ambiental ou a orientação para a adoção de políticas de comunicação mais participativas, ainda existe uma certa resistência quanto a esse raciocínio da “construção em rede”. A pergunta que não quer calar, e ela não se restringe apenas à cabeça do empreendedor, é a seguinte:
Até que ponto isso é realmente possível?
A ISO 26.000, publicada em 2010, esclarece diversos conceitos e ações da tal Responsabilidade Social.
“Responsabilidade de uma organização pelos impactos de suas decisões e atividades na sociedade e no meio ambiente, por meio de um comportamento ético e transparente que:
- Contribua para o desenvolvimento sustentável, inclusive a saúde e o bem estar da sociedade;
- Leve em consideração as expectativas das partes interessadas;
- Esteja em conformidade com a legislação aplicável e seja consistente com as normas internacionais de comportamento;
- Esteja integrada em toda organização e seja aplicada em suas relações”
Apesar de não ser uma ISO de certificação, ela orienta um consenso internacional sobre o tema, claramente estampado, por exemplo, nos Padrões de Desempenho da International Finance Corporation (IFC) que, por sua vez, fundamentam os Princípios do Equador, dos quais várias importantes instituições financeiras são signatárias. O documento aponta claramente para uma comunicação em rede, em que as empresas são apenas mais um nó nessa “teia”, ainda que com muita centralidade, mas não o centro das ações, concepções e decisões.
Esta soma promove a percepção de que a organização é parte da sociedade e não o seu núcleo. Isso significa que a voz da sua empresa é uma voz em meio a muitas outras. Se trata de uma voz importante e pode possivelmente atuar de forma estratégica? Sim, podendo ter elevada capacidade de influência e multiplicação de conhecimento, mas não é a única fonte de informação das partes interessadas.
“A empresa não é a dona do processo de comunicação, e sim parte dele, já que a comunicação é feita na interação com o outro”, escreve Isadora Camargos, especialista de Comunicação Estratégica e Educação Ambiental na Ferreira Rocha, em artigo para a CONFIBERCOM. Ela defende que é preciso entender que a organização faz parte de uma rede social: ela não é o núcleo de uma comunidade.
Uma das formas de a empresa estruturar seu papel enquanto propagadora de informação é o cumprimento da Instrução Normativa nº 2, publicada pelo Ibama em 2012. Ela estabelece as bases para a realização de programas de educação ambiental obrigatórios no processo de licenciamento, com componentes para grupos sociais locais e para trabalhadores do projeto.
Ao conceber a comunidade como um “parceiro vital” na defesa dos recursos naturais – contanto que sensibilizada e capacitada para tal – a norma também aponta um caminho para a construção compartilhada.
A participação popular fortalece o processo de licenciamento ambiental, não apenas cumprindo um requisito legal. Ela também pode identificar alternativas que levem benefícios às comunidades, aos interesses do empreendedor e ainda fortaleçam a atuação e a imagem dos órgãos públicos envolvidos.
Quando os programas de Comunicação Social e Educação Ambiental são elaborados segundo essa ótica, se tornam extremamente estratégicos para o empreendedor.
Tais iniciativas conseguem gerar insumos para uma gestão social eficaz e contribuem para maior previsibilidade de expectativas, demandas e custos associados. Chega-se aí a um aprimoramento do planejamento econômico-financeiro do empreendimento, de forma não apenas lucrativa, como também responsável.