REFLEXÕES SOBRE O 1º WORKSHOP: INVENTÁRIOS HIDRELÉTRICOS PARTICIPATIVOS

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Delfim Rocha, Diretor Executivo da Ferreira Rocha Gestão de Projetos Sustentáveis

Ontem, 20 de setembro, ocorreu na sede da ANEEL, em Brasília, o 1º Workshop “Inventários Hidrelétricos Participativos”. O evento contou com a participação da Agência, da EPE, da ONS e da ANA, bem como do Ibama, outros órgãos ambientais (FEPAM, IMASUL), FUNAI, Ministério Público de Goiás e TCU. Entre outros, a Associação Nacional de Engenharia, diversas associações do Setor Elétrico, o Instituto Acende Brasil e executivos de várias empresas concessionárias – nacionais e multinacionais – e projetistas de empreendimentos hidrelétricos também estiveram presentes.

A Questão a ser solucionada

Logo na abertura do evento, o Diretor da ANEEL admitiu que, atualmente, a forma de desenvolvimento dos inventários não privilegia a participação dos diversos entes envolvidos nos processos de viabilização ambiental dos empreendimentos e tampouco as organizações sociais. Completando, o Superintendente de Concessões e Autorizações de Geração da Agência pontuou: “Temos condições de envolver outros órgãos nos estudos de inventário hidrelétrico? Como operacionalizar esse envolvimento?

As apresentações e intervenções ao longo do evento deixaram claro que, seja por crença ou por força das várias externalidades que caracterizam os processos de licenciamento ambiental no país, esse envolvimento é fundamental. No entanto, o que se viu no evento é que muito ainda temos que caminhar para que a real participação dos atores sociais – e não somente dos intervenientes institucionais no licenciamento – venha a fazer parte dos inventários hidrelétricos.

HERA: um poderoso avanço para o processo de inventário

Mais uma vez demostrou-se que o setor elétrico nacional é capaz de desenvolver tecnologias e ferramental que o colocam em posição inegável de destaque no cenário internacional. Prova irrefutável é o HERA, modelo computacional criado pela PSR Inc. no âmbito do projeto de P&D realizado pela EDF Norte Fluminense, e que suporta a tomada de decisão para alternativas de desenvolvimento hidrelétrico na fase de inventário.

A despeito de divergir em alguns critérios de análise, o HERA incorpora a metodologia de Avaliação Ambiental Integrada (AAI) ao processo do inventário hidrelétrico, procedimento que sempre defendemos. No entanto, traz a vantagem de propiciar a avaliação socioambiental para diferentes alternativas de partição e arranjos que podem ser rapidamente conceituadas e analisadas por meio do HERA, e não apenas para a configuração final resultante do inventário, como ainda é feito atualmente.

Vemos com muito bons olhos a participação da The Nature Conservancy (TNC) no processo, o que a consolida como uma parceira relevante para a sustentabilidade da cadeia de valor do Setor Elétrico. A TNC traz a incorporação da ferramenta Blueprint às análises socioambientais feitas pelo HERA. Por meio de metodologia própria, identifica as áreas de maior sensibilidade na bacia e que, se impactadas, poderão comprometer, de forma significativa, a sustentabilidade do território.

A incorporação estratégica da variável social ao HERA

A TNC reconhece que a concentração da análise por meio do Blueprint ainda guarda foco na temática ambiental, restando desenvolver a social. Concordamos que isto poderá ser viabilizado sem maiores problemas e incorporado ao HERA, que é alimentado por mapas georreferenciados conformado diferentes layers de dados.

No entanto, é possível alavancar ainda mais os benefícios do HERA para o processo de inventário se a ele incorporarmos mapeamentos de importantes atributos sociais para a tomada de decisão. Como exemplos, temos: comunidades tradicionais – e não apenas Terras Indígenas e áreas quilombolas já reconhecidas -, níveis de vulnerabilidade social dessas populações, conflitos e os modelos mentais que os alimentam etc. Todas essas variáveis são passíveis de tradução em mapas georreferenciados, conforme demonstram trabalhos já realizados pela Ferreira Rocha para diferentes setores produtivos: geração de energia, mineração e agropecuária.

Mas e o efetivo diálogo e consulta às potenciais partes afetadas?

Um dos principais objetivos do HERA é ser uma ferramenta de gestão de riscos, facilitando e agilizando a antevisão de diferentes alternativas de aproveitamento do potencial hidrelétrico em uma bacia. Muito se falou também sobre o modelo computacional ser uma potente ferramenta de comunicação, inclusive visual, junto às partes interessadas. Então, para potencializar seu uso e realmente transformá-lo em instrumento vital para a tomada de decisão a partir de uma visão integrada e multilateral, é preciso que o mesmo seja alimentado com a visão das diferentes partes interessadas sobre o futuro da bacia.

Continuar a postergar a identificação dos riscos sociais e de seu enfrentamento por meio da concepção e implantação de planos estratégicos de ação não resolverá um dos maiores dificultadores à participação das fontes hidrelétricas em nossa matriz energética e ao desestímulo a novos investimentos privados no setor em função de suas elevadas externalidades de custos e cronogramas.

Uma das grandes questões é como contatar as populações e comunidades de uma bacia hidrográfica na fase de inventário, repleta de incertezas, sem levantar inúmeras expectativas. Certamente o problema extrapola a simples comunicação unidirecional.

Nossa experiência na Ferreira Rocha mostra que a comunicação tradicional é uma das formas que deve ser utilizada, mas não a central. É preciso estabelecer o efetivo diálogo e fazemos uso de amplo conjunto de técnicas para tal, por meio do planejamento prévio de protocolos customizados de consulta, como abordagens apreciativas, grupos de discussão, entre outras.

Se, como apontou o representante do Ministério Público de Goiás, o que a instituição reconhece é a importância do diálogo, tentar evitá-lo na fase de busca e avaliação de alternativas certamente não é o caminho para procurar reduzir conflitos os mais diversos, algumas das maiores dificuldades atuais para a materialização do aproveitamento hidrelétrico tão necessário para nosso País.

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